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domingo, julho 27, 2003

 

como num filme , ela rapidamente abre os olhos vertendo o sono para um tempo cuja gestação apenas se compara ao comprimento do cordão umbilical que desdobra a mulher em mãe e criadora. ela uma mulher idosa em regressão que acorda no exacto momento em que me ajoelho sobre cânticos para lhe roubar a alma e me assalta, ?ela vem já...? eu, surpreso fico mudo e perdido naquela voz arranhada pela força com que emergiu das entranhas da terra. ?ela vem já... não deve demorar...?, continua ela vagarosa, fitando-me o corpo como se visse apenas um vulto e para além da minha alma nada mais distingue, devido talvez à sua visão desbastada pela idade. ?está bem, eu espero?, foram as palavras possíveis com que me dirigi para ela, temendo ferir a sua memória. compreendi que ela estava agarrada a um passado e com dificuldade se mantinha acordada à solidão acocorada na berma da estrada. ?ela foi atrás da mãe, mas já vem...? continuou ela. ?está bem, não se preocupe que eu espero?. este ?eu espero? ressoou na minha cabeça como um enorme sino de bronze badalando para cá e para lá o tempo. que sei eu desta enorme palavra ?esperar?? nada. não sei nada e me reduzo a essa insignificância de quem anda neste mundo há dois dias. esperar é um grande acto de dignidade e ela, aquela senhora, toda magnificente se funde sentada na berma da estrada que é como o tempo por onde toda a gente passa e o alimenta, até se lhes restar apenas o pó, o início.

isto aconteceu, e é a verdadeira crónica de uma fotografia que tirei há tempos atrás.

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Vermelhar   
o palato tem cor rosada. vermelho quando irado